sábado, 1 de maio de 2010

Brasília 50 anos

Em 1979 cheguei. Defrontei-me com um deserto de concreto cinza e luz que me deixaram desconcertada, desconfortável, quase constrangida.Não havia engarrafamentos nem poluição.Para ver favela, tínhamos que dar a volta no lago.De carro.Até a Barragem.Passeio de um dia, já na agenda compulsória dos parentes que vinham de visita.
Por dois longos anos chorei ao travesseiro, com saudades de outros paradigmas, naquele tempo ainda não esquecidos.
Depois fui me conformando, ao deparar-me com a Brasília mística, dos ets de Kronemberger e das vigílias de Uchôa. Entre elementais e nasceres da lua no extinto Trem do Lago, e os arroubos adolescentes pelos conjuntos de rock da cidade, (presente até nos ensaios) meio que sobrevivi: Pôr do Sol, Legião,Capital...que saudades...
Brasília, em teu seio participei de panelaços e buzinaços pelas diretas já, chorei no enterro do Tancredo, meu carro foi chicoteado pelo Louco General (sim,aquele ) montado em seu cavalo!
Depois veio a UnB, minha paixão pela Sociolinguística, por Tarallo, pela Análise do Discurso, pelos estudos da linguagem, o português para estrangeiros, o primeiro emprego, o noivado, o casamento...
E Tu,a cidade da qual antes eu fugia tanto, acabou por me dominar...a tal ponto que me senti tua filha legítima, e passei a defender-te dos que te queriam destruir: governos corruptos, grilagem de terras,destruição ambiental, destruição arquitetônica, políticos desonestos...vi teu Plano Piloto se inchar de miséria e lixo e ficaste doente.
E eu que até aqui era filha, me fiz mãe.Em solo materno aprendi a ninar minha filha para afastar os monstros que insistiam em chegar.
Muitos vieram.Destruíram meus sonhos e minha família.Roubaram meus poucos recursos, me enganaram.Fingiram ser meus amigos e me traíram.Aqui sofri o que jamais poderia imaginar.
Hoje não me encaixo mais uma vez em teus enquadramentos.
De novo te vejo árida, desértica, em vão deixo-me levar pelos teus rodamoinhos até os ipês.
Não me protegeste quando precisei.Fiquei sozinha num falso e desmistificado planalto, nada central.
Me descentralizei.E agora te vejo totalmente irrecuperável.A Utopia que eu queria que tivesse dado certo, não vingou.Muitos Juscelinos e Lúcios Costas estão desapontados.
Estou triste e por isso não posso te desejar um feliz aniversário.
Em busca de resgatar-te, cada vez mais me perco de ti e não te reconheço mais.Não és mais minha amiga.
Hoje choro ao te ver violenta no trânsito, violenta nas ruas.Vejo a falta de educação do teu povo e já nele não me incluo.
Escolas favelizadas.Juventude violenta e usuária de drogas.Ladrões invadem as casas.Morte no trânsito.Lixo infindável nas ruas.Corrupção esmagadora em todos os poderes.Governador preso.Hospitais destruídos e sucateados.O Lago morre sufocado pelas algas.As preferenciais  das ruas já não mais existem.
Eu chego aos 44 anos sem asas, perdi a norte e a sul.Meus eixos estão sem eixo, nada monumental acontece.Tu chegas aos 50 anos em desvantagem: não podes desertar de mim assim como eu posso desertar de ti.Não podes me abandonar agora, pois já o fizeste num passado imperfeito, quando eras uma vez...
Meu Plano Diretor de te salvar das barbáries leste e oeste, das Câmaras Autolegislativas, dos espigões de 20 andares, não deu certo.Sigo viagem então, sem muita escolha.Sigo para frente, sem olhar pelo retrovisor.
No centro de um coração vazio, venta um planalto sem bandeiras e sem cristais brilhantes, desses que encantam as criancinhas.
Buscarei novamente outros paradigmas, que não o das tesourinhas e quebra-molas.
Preciso de ar mais do que de luz.Te chamei um dia de cidade-luz, lembra?
Agora as luzes se apagam, fraquinhas na minha lembrança.
Quisera eu te recuperar feito uma Dom Quixote de saias à minha maneira: com jardins de Burle  e azulejos de Athos.
Mas não quero mais.Partiu há muito tempo a minha alma, muito antes de partir o meu coração.
E para não dizer que não falei de partidos, aprendi na década de 80, com um ex-Barão que se vestia de vermelho, que o meu partido é um coração partido.Mas tu sabes que como eu, muitos outros também partiram.
Adeus, querida, me juntarei à enorme multidão de Geraldos,Cazuzas e Osvaldos, entre outros...
Adeus, querida.Saiba que te amei.
Aqui jaz minha saudade nos mal-tratados campos de minha esperança.

Patricia Mich

terça-feira, 9 de março de 2010

Sobre o Belo e o Perfeito

A árvore estava lá há décadas, mas só hoje eu a encontrei.

Raízes longe do chão, (pasmem!) ela cresceu sobre uma enorme pedra cinza, com outras pedras cinzas menores ao redor.
Ela repousa sobre a pedra como uma grande mão aberta, as pontas das raízes , como finos e raquíticos dedos, tocam de leve o solo em volta da pedra.

Seu tronco não é reto, tampouco liso e cilíndrico (como guardamos no nosso imaginário de árvore): é torto, curvado, pendente para um lado.Existem ainda duas protuberâncias enormes, como se fossem tumores, formando anéis em torno dela.

E o que dizer da copa?Galhos secos,(de uma cor marrom intensa) retorcidos e finos, falta absoluta de folhas e, poucas, mas maravilhosas flores de um rosa claro e delicado.

Foi eleita, imediatamente, para mim, a árvore mais bela de todo o planeta.Sei que não corro o risco de me arrepender, ainda que não tenha visto todas as árvores do mundo.Ela é absoluta e única, dessas que não se repetirão nunca mais na história da natureza.

Ela é a minha descoberta pessoal de imperfeita perfeição da beleza, o meu paradigma final de árvore, o meu poema pessoal.

Reina, absoluta, ao sabor do vento, e vive onde prendeu suas raízes, presas, estas, apesar da pedra.

Sim, a pedra. Essa árvore fez do seu maior obstáculo, o seu altar,o seu palco.Fez também de cada uma de suas imperfeições um maravilhoso e inigualável conjunto de singularidade.E tornou-se, por isso mesmo, a rainha de todas as árvores.

Olho para ela e percebo o quanto a paisagem verde, o grande lago e as outras árvores (comuns e totalmente dentro dos padrões normais esperados para árvores) realçam sua beleza.

Com ela eu finalmente decodifiquei algo que o Universo já vinha, talvez, há muito tempo querendo me mostrar: a singularidade das imperfeições construindo uma beleza única, onde não cabem nem crítica, nem retoques.

E que somos, cada um de nós, como essa árvore: irrevogáveis em nossas particularidades, capazes de fixarmos raízes em pedra, e de fazer do obstáculo um espetáculo.
E mais: somos capazes também de transformar, de transmutar nossas dores e pedras em altares, palcos... onde seremos estrelas únicas, senhores de nossas próprias pedras, deuses de nosso destino.

Nossas poucas e lindíssimas flores, trabalhosas, por isso raras, são os mil textos que jogamos ao vento, como sementes a serem espalhadas e plantadas, (quem sabe?), em solos remotos, mas, esperamos, férteis.

Obrigada, (nova) velha árvore, bela, imperfeita e absoluta árvore, minha perfeição pessoal, por essa magnífica lição.

domingo, 7 de março de 2010

Inaugurando o meu blog

Oi, pessoal!
Esta é a postagem de inauguração do meu blog.
Esta é também a concretização de uma das inúmeras resoluções para 2010: criar meu blog, voltar a escrever...
Nele pretendo abordar de tudo um pouco, entre escritos pessoais,poesias, contos, crônicas, reflexões de temas do dia a dia...enfim, que seja um espaço onde eu possa expressar o que penso e o que quero, o meu lugar no mundo...!
Espero que curtam também.
Abs
Patricia Mich